Homilia de São Pedro e São Paulo
- bozumiiiiii
- 30 de jun. de 2024
- 6 min de leitura

Homilia da celebração dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo
Homilia do Papa Francisco na celebração dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo
HOMILIA DO PAPA FRANCISCO
Eucaristia, com a bênção dos pálios,
na Solenidade dos Apóstolos São Pedro e São Paulo
(Basílica de S. Pedro, 29 de junho de 2021)
"Celebramos hoje a festa de dois grandes apóstolos do Evangelho e duas colunas angulares da Igreja: Pedro e Paulo. Observemos de perto estas duas testemunhas da fé: no centro da sua história, não está a própria destreza, mas o encontro com Cristo que lhes mudou a vida. Fizeram a experiência de um amor que os curou e libertou e, por isso, tornaram-se apóstolos e ministros de libertação para os outros.
Pedro e Paulo são livres unicamente porque foram libertados. Detenhamo-nos neste ponto central.
Pedro, o pescador da Galileia, foi libertado em primeiro lugar da sensação de ser inadequado e da amargura de ter falido, e isso verificou-se graças ao amor incondicional de Jesus. Embora fosse um hábil pescador, várias vezes experimentou, em plena noite, o sabor amargo da derrota por não ter pescado nada (cf. Lc 5, 5; Jo 21, 5) e, perante as redes vazias, sentiu a tentação do desânimo; apesar de forte e impetuoso, muitas vezes se deixou tomar pelo medo (cf. Mt 14, 30); embora fosse um discípulo apaixonado do Senhor, continuou a pensar à maneira do mundo, sem conseguir entender e aceitar o significado da Cruz de Cristo (cf. Mt 16, 22); apesar de dizer-se pronto a dar a vida por Ele, bastou sentir-se suspeitado de ser um dos Seus para se atemorizar chegando a negar o Mestre (cf. Mc 14, 66-72).
Mas Jesus amou-o desinteressadamente e apostou nele. Encorajou-o a não desistir, a lançar novamente as redes ao mar, a caminhar sobre as águas, a olhar com coragem para a sua própria fraqueza, a segui-Lo pelo caminho da Cruz, a dar a vida pelos irmãos, a apascentar as suas ovelhas. Deste modo libertou-o do medo, dos cálculos baseados apenas nas seguranças humanas, das preocupações mundanas, infundindo nele a coragem de arriscar tudo e a alegria de se sentir pescador de homens. Foi precisamente a ele que chamou para confirmar na fé os irmãos (cf. Lc 22, 32). Como ouvimos no Evangelho, deu-lhe as chaves para abrir as portas que levam a encontrar o Senhor e o poder de ligar e desatar: ligar os irmãos a Cristo e desatar os nós e as correntes das suas vidas (cf. Mt 16, 19).
Tudo isto só foi possível, porque antes, como nos dizia a primeira Leitura, Pedro foi libertado. As correntes que o mantêm prisioneiro são quebradas e, tal como aconteceu na noite da libertação dos israelitas da escravidão do Egito, é convidado a levantar-se depressa, colocar o cinto e calçar as sandálias para sair. E o Senhor abre as portas diante dele (cf. At 12, 7-10). É uma nova história de abertura, de libertação, de correntes quebradas, de saída do cárcere que o prende. Pedro faz a experiência da Páscoa: o Senhor libertou-o.
Também o apóstolo Paulo experimentou a libertação por obra de Cristo. Foi libertado da escravidão mais opressiva, a de si mesmo, e de Saulo – nome do primeiro rei de Israel – tornou-se Paulo, que significa «pequeno». Foi libertado também daquele zelo religioso que o tornara fanático na defesa das tradições recebidas (cf. Gal 1, 14) e violento ao perseguir os cristãos. A observância formal da religião e a defesa implacável da tradição, em vez de o abrir ao amor de Deus e dos irmãos, haviam-no endurecido. Foi disto que Deus o libertou; ao invés, não o poupou a tantas fraquezas e dificuldades que tornaram mais fecunda a sua missão evangelizadora: as canseiras do apostolado, a enfermidade física (cf. Gal 4, 13-14); as violências e perseguições, os naufrágios, a fome e sede, e – segundo as suas próprias palavras – um espinho que o atormentava na carne (cf. 2 Cor 12, 7-10).
Paulo compreendeu assim que «o que há de fraco no mundo é que Deus escolheu para confundir o que é forte» (1 Cor 1, 27), que tudo podemos n’Ele que nos dá força (cf. Flp 4, 13), que nada poderá jamais separar-nos do seu amor (cf. Rm 8, 35-39). Por isso, no final da sua vida, como nos dizia a segunda Leitura, Paulo pode dizer: «o Senhor esteve comigo» e «me livrará de todo o mal» (2 Tm 4, 17.18). Paulo fez a experiência da Páscoa: o Senhor libertou-o.
Queridos irmãos e irmãs, a Igreja olha para estes dois gigantes da fé e vê dois Apóstolos que libertaram a força do Evangelho no mundo, só porque antes foram libertados pelo encontro com Cristo. Ele não os julgou, nem humilhou, mas partilhou de perto e afetuosamente a sua vida, sustentando-os com a sua própria oração e, às vezes, admoestando-os para os impelir à mudança. A Pedro, disse Jesus com ternura: «Eu roguei por ti, para que a tua fé não desapareça» (Lc 22, 32); a Paulo, pergunta: «Saulo, Saulo, porque Me persegues?» (At 9, 4). De igual modo procede Jesus também connosco: assegura-nos a sua proximidade, rezando por nós e intercedendo junto do Pai; e repreende-nos com doçura quando erramos, para podermos encontrar a força de nos levantar novamente e retomar o caminho.
Tocados pelo Senhor, também nós somos libertados. E sempre temos necessidade de ser libertados, porque só uma Igreja liberta é uma Igreja credível. Como Pedro, somos chamados a ser libertos da sensação da derrota face à nossa pesca por vezes malsucedida; a ser libertos do medo que nos paralisa e torna medrosos, fechando-nos nas nossas seguranças e tirando-nos a coragem da profecia. Como Paulo, somos chamados a ser libertos das hipocrisias da exterioridade; libertos da tentação de nos impormos com a força do mundo, e não com a debilidade que deixa espaço a Deus; libertos duma observância religiosa que nos torna rígidos e inflexíveis; libertos de vínculos ambíguos com o poder e do medo de ser incompreendidos e atacados.
Pedro e Paulo oferecem-nos a imagem duma Igreja confiada às nossas mãos, mas conduzida pelo Senhor com fidelidade e ternura; duma Igreja débil, mas forte com a presença de Deus; duma Igreja libertada que pode oferecer ao mundo aquela libertação que ele, sozinho, não se pode dar a si mesmo: a libertação do pecado, da morte, da resignação, do sentimento da injustiça, da perda da esperança que embrutece a vida das mulheres e dos homens do nosso tempo.
Interroguemo-nos: quanta necessidade de libertação têm as nossas cidades, as nossas sociedades, o nosso mundo? Quantas correntes devem ser quebradas e quantas portas trancadas devem ser abertas! Podemos ser colaboradores desta libertação, mas só se, primeiro, nos deixarmos libertar pela novidade de Jesus e caminharmos na liberdade do Espírito Santo.
Hoje os nossos irmãos Arcebispos recebem o Pálio. Este sinal de unidade com Pedro recorda a missão do pastor que dá a vida pelo rebanho. É dando a vida que o Pastor, liberto de si mesmo, se torna instrumento de libertação para os irmãos. Hoje temos connosco a Delegação do Patriarcado Ecuménico, enviada para esta ocasião pelo querido irmão Bartolomeu: a vossa amável presença é um sinal precioso de unidade no caminho de libertação das distâncias que, escandalosamente, dividem os crentes em Cristo.
Rezamos por vós, pelos Pastores, pela Igreja, por todos nós: para que, libertados por Cristo, possamos ser apóstolos de libertação em todo o mundo."
Rezemos para que os santos apóstolos intercedam pela nossa Igreja nesses tempos de crise, santificando cada vez mais o nosso clero.
Pequena Homilia
«É preciosa aos olhos do Senhor a morte dos que lhe são fiéis» (Sl 115,15). Uma religião cujo fundamento é o mistério da cruz de Cristo não pode ser destruída por nenhum tipo de crueldade. A Igreja não é diminuída pela perseguição, mas fortalecida por ela: o campo do Senhor fica coberto por uma seara cada vez mais rica, porque as sementes, caindo uma a uma, renascem multiplicadas.
Milhares de mártires bem-aventurados testemunham a multiplicação da posteridade dessas duas gloriosas sementes da sementeira divina, os apóstolos Pedro e Paulo. Émulos de um e outro no seu triunfo, eles encheram a nossa cidade de Roma de uma multidão de púrpura, cujo brilho resplandece ao longe, e coroam-na com um diadema engastado com o esplendor de inúmeras pedras preciosas.
Nós alegramo-nos, amados filhos, celebrando a memória e invocando a proteção de todos estes santos que Deus nos deu como exemplos de paciência e sustentáculos da nossa fé. Mas devemos alegrar-nos ainda mais pela glória eminente destes dois apóstolos, que foram seus pais. A graça de Deus elevou-os tão alto entre todos os membros da Igreja que, neste corpo de que Cristo é a cabeça, eles podem ser comparados à luz dos dois olhos. Quando pensamos nos seus méritos e virtudes, que ultrapassam tudo o que se pode dizer deles, não devemos preferir um ao outro nem dissociá-los. Porque a mesma eleição os tornou iguais, a mesma tarefa os tornou semelhantes, o mesmo fim os uniu.
Como nós experimentámos e como os nossos predecessores atestaram, acreditamos e esperamos que as orações destes dois dignos protetores nos obtenham a misericórdia de Deus no meio das provações desta vida; assim, por muito esmagados que nos sintamos pelo peso dos nossos pecados, seremos elevados pelos méritos destes apóstolos.
São Leão Magno (?-c. 461), papa, doutor da Igreja
Sermão 82, 6-7
São Pedro e São Paulo, apóstolos da paixão de nosso Senhor, rogai por nos
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